A aventura das palavras... das palavras... as palavras... as palavras

A aventura das palavras... das palavras... as palavras... as palavras
São o chão em chamas onde as lavras

domingo, junho 29, 2014

RELEITURAS E REVISITAÇÕES



Pois, eu, tenho quase mil anos
Dentro do tempo que já vivi…
Metade, foram só desenganos
Acerca dos projetos insanos
Por que tanto lutei e me bati.

Uns, ditaram-me a conduta;
Outros, forjaram-me o caráter.
Por fim, entraram ambos em luta
A incendiar a fogueira estulta
Onde ia de perecer como mártir.

Aí, então, dei-me por vencido,
E capitulei humilde e só,
Na esperança de ao ver-me caído
De mim mesmo tivesse algum dó.

Não tive; antes pelo contrário
Recriminei-me intransigente,
Até reconhecer ser meu fadário
Esse insistir no tem-te-não-tem-te
A tentar viver outras mil – novamente!


J Maria Castanho
HESITAÇÃO É AJUSTE



Será que digo? Ou não digo?
Será que penso e me calo?
Ou apenas mastigo
Esse seco e dolente figo
Da dúvida que de mim exalo?

Ter a alma por um fio
De que estamos suspensos também
Naquele dlim-dlão de arrepio
Que é motivo de fastio
Na fome que mais ninguém tem,
Pode ser apenas feitio…

Mas, se for sina, é quanto baste
Para arrepender qualquer ousado;
E ainda que a necessidade o arraste
Vem a suspeita, e dá-lhe dobrado.


J Maria Castanho 

sábado, junho 28, 2014

INCONFUNDÍVEL CONVICÇÃO



Escuto tua profunda respiração
A ecoar no mais recôndito de mim,
Pondo a nu o segredo da criação
Da materna humanidade sem fim…

E digo-lhe que o sagrado é a voz,
Tão celestial como infinita,
Que mesmo se mais ninguém acredita
Ela ecoa, e repete, que ainda crê em nós.


J Maria Castanho
PANEGÍRICO LUNAR



Se me desdoem os sons
Ao silêncio subtraídos,
Em cujos acordes, os plafons,
São agudos de graves sentidos…

É porque assim me adorno
Dessa sombra minguante,
Em que também eu me torno
Caminho de ti e caminhante:
Eleição sem pressupostos,
Nem condições pertinentes,
Além do estar sempre a postos
Em todos os quarto-crescentes.


J Maria Castanho  

sexta-feira, junho 27, 2014

IGUALDADE DE GÉNERO




Tudo quanto te digo
Já foi dito há milênios,
Pois foi nessa luta por ti, e contigo
Que nos tornámos gêmeos.


J Maria Castanho

E SIGA O BAILE!

 

 
 
Ora José, lambe a ferida

Que o Mundial te deixou,

Porque a vida se é vida

Vai e faz, não diz «eu vou».

 

J Maria Castanho
GANOU-SE!



800 anos de bagunça,
Com a bagaceira por ideal,
Ataram a língua com a junça
Dos estrangeirismos em Portugal,
Selecionável, ou não,
Que o portuga é bom, é no paleio…

Que assim que lhe pedem ação
Faz retórica, e bloqueio.


J Maria Castanho

terça-feira, junho 24, 2014

PELO RUMAR DA FALA



Despi a voz de todos os ecos
Mas enleou-se ainda ao observar
Que na língua não há rios secos
Mesmo que os não ouçamos murmurar…

Por isso, se escorro e me alongo,
Ou me entrincheiro entre margens,
É porque no pulsar soa o gongo
Da rima que rema novas viagens.


J Maria Castanho
MOSTRAR A CARECA



«O nevoeiro da madrugada
Traz cãs a quem retorna a casa,
E dá à tez a pele enrugada
Do tição, quando molha a brasa»,
Assim me dizia minha avó, velhota,
Se eu me atardara na chegada
Quando, por qualquer garota
Fazia pernoita, ou simples noitada.

Agora, já ninguém me diz nada.
Porém, plo sim, plo talvez, plo não,
Ando com a cabeça bem rapada,
Não vá acordar a superstição…


J Maria Castanho

segunda-feira, junho 23, 2014

HABILITAÇÕES PRÓPRIAS



Nada justifica o pretérito
Que o futuro não reconheça;
Assim dá o tempo o mérito
A quem de si mesmo é pertença…

Mas eu, súbdito, nada peço
Além desse imperativo exigente,
Pois de tudo o que há, só mereço
Ser reconhecido como gente.

DRIBLAR O RECEIO



Desce do silêncio e inventa
Definitivamente a porta da luz,
O silvo verde, azul e magenta
Na contagem do ser e da jus,
Que o farol de todos os naufrágios
É ali, mesmo a teu lado, ante o altar
Onde se reúnem vaticínios e presságios,
Qual oráculo que só diz o queremos escutar…

Depois, reconta em silêncio como quem reza,
E finge querer, unicamente, o que o azar despreza.

ROSA PROGESTERADA



Nos contornos do abstrato
Quando o visível de invisível se vinca,
Nas faldas do meigo mato
A corça titila e brinca;
E assim ela nos elucida
Nesse pétala a pétala
Desfolhado, da ferida
Por quanto deveras cala…

Porém, o salto em sustenido
Em que nos omite, emite a flor,
Como que um sonho renascido
Desse parto… que foi apenas dor.

DESPERTAR SILENTE



Sopro o mansinho da névoa,
Apago as defesas sólidas à liquidez do verbo,
Desço degrau a degrau a muralha de nuvens
Que a sinuosidade das horas me construiu em volta,
Qual cintura de silêncio onde a manhã me habita.

Tenho sempre extensões prontas pràs metonímias da luz
Das quais me socorro como de óculos escuros, fumados
Os teledentritos da expetativa são caminhos entre complementos
Numa oração intrinsecamente devota às vestais
Nunca à deusa mas a quem a serve singela e livre
Desvendando a nudez inominável dos nomes
Desfechando o arco do corpo no orgasmo do grito.

Tenho sede de tua fome quando só o abraço a sacia
Porém procuro-te ainda no veludo melaço dos figos maduros
Seda suculenta sob a língua bárbara ante o império da pele
Que poro a poro é descoberta a luziluzir no algodão matinal
Encastelado de espera sobre espera em direção à elevada profundidade
– O ser nuclear jogando fora as cascas oxidadas do ontem.

domingo, junho 22, 2014

ME DEMORO NO LÚDICO LODO



Apologista do incomparável, ou não, trago
A trago a paisagem me embriaga
O olhar como um néctar contagiante,
E escrevem-me sonetos verdes
Outros debruns rendilhados,
Quais rameados arcaicos de sublinhar azuis.

Porém, ainda nada sei de cor
E só pela execução do sorriso afago
Se pinto nenúfares nos pauis
Cuja ânsia, movediça e inconstante,
Sobre o instante desce a adaga
Da língua que soletra como afaga
Toda a distância entre menor e maior…

Porque nada me suspende aí, agora
Onde me atolo no lodo da ilusão que demora.


J Maria Castanho 
ASPIRAÇÃO AXIOMÁTICA



Me aboboro até aos genes ancestrais
Nesse licor que me escorre e também me destila
Qual língua cujo nome me consome
E greta e esfarela na moída argila
Do tempo que apenas regressa nos murais
Das cavernas em rupestre que só diz quando exila…

Porque estreita é a margem da poesia,
Várzea fugaz a ladear o rio do momento,
Cercadura barroca para a gótica letargia
Das tempestades em perpetuação do movimento
Que nunca foi, luz suspensa da noite sem dia.


J Maria Castanho

domingo, junho 15, 2014

DA LUCIDEZ DO AMOR



Quem mais terá dito, assim
Que o verbo não se demora
No paleio à beira do fim
Com o minuto maior que a hora?

Por mim o creio, se comigo estás
No inteiro desse segundo
Que é o sonho, quando nos traz,
Bem prò meio da realidade do mundo.


J Maria Castanho

sábado, junho 14, 2014

RUMORES



São como hinos, as mãos silenciosas
Nos gestos precisos e exatos,
Das feirantes de artesanatos
Que capricham, capricham
Sem, porém, serem caprichosas.

Replicam, consertam, e recriam
Como quem executa pura magia,
Se cerzem uma simples meia…
E nesse cerzir de falas cuidadosas
Tecem e entretecem a melodia
Das aranhas apanhadas na teia.


J Maria Castanho
UPA!



Limpa bem os pés,
Se vais partir.
E cuidado com quem deixas para trás…

É que, quando o futuro surgir
Na curva estreita sem cores nem fés,
Ele pode esquecer-se de quem és
– Ou de como estás.


J Maria Castanho

sexta-feira, junho 13, 2014

DA DIMENSÃO E ORIGEM DO UNIVERSO



Sabes, no mundo, os mundos são ainda muitos mais
Do que todos quantos são aqueles que já conhecemos,
Em que há sempre mais um por cada um dos animais,
Incluindo todos os homens e mulheres – pelo menos!


                                                                             J Maria Castanho
SINGULARIDADES DO CANETO



À noite, no serralho, as garinas
Como quem não dava pela cousa,
Gizavam figurinhas, tão candidinhas
Que até faziam corar a lousa.


J Maria Castanho
SER INTEGRAL



A farinha desse trigo
Que o tempo tanto moeu,
Trará ainda consigo
Esse farelo que sou eu…

Sonhador de longo curso,
Cavaleiro sem cavalo,
Pirata, escriba, corso
E maré no intervalo

Entre uma vaga e outra vaga
Que acerta sempre em cheio,
Da espiga moída que traga
O Mar da Palha bem no meio.


J Maria Castanho

terça-feira, junho 10, 2014



BACO E PORTUS ALACER

Rouxinol de vinho tinto
Só canta de alma cheia,
Tal e qual eu me sinto
Inda-bem-não, volta e meia!


J Maria Castanho


LUZ DA TARDE

O luar da tarde, é pequenino
E mal se nota no azul do céu
A lua, cujo brilho é destino
De entretecer o destino meu…

Joaquim Castanho



NO ENCLAVE DAS VOZES

Essa ária que o futuro entoa
Em vozes de muito sotaque
Dão ao afeto o brilho que soa
Na clave dum sol que bem as trate…


J Maria Castanho

quinta-feira, junho 05, 2014

VESPERTINA PRECE



Que o quarto-crescente entre
Pla janela do quarto e construa,
Tão lesto como imediatamente,
Sobre a cama tua silhueta nua…

Que o quarto-crescente diga
De repente teus lábios abertos,
E sopre as areias da fadiga
Prà imensa ilusão dos desertos.


J Maria Castanho

domingo, junho 01, 2014


BAILIA CONJUGAL



Dançam na laçada do fio
Os olhos que a cor alinha,
E por demais a eles me alio
Jungindo tua alma na minha.

J Maria Castanho


(Imagem: Tapeçaria de Portalegre, segundo cartão de Guilherme Camarinha)
PROFUNDO ECO



Esta água já não é igual
À demais água que caiu do céu,
Pois canta ainda o madrigal
Da passada que sobre a ponte deu

Teu pé jungido pela sandália,
As vestes flanando sob a brisa,
E nos cabelos o lírio e a dália
A perfumarem a doce ecolália
Dessa ária que só o amor giza.


J Maria Castanho