A aventura das palavras... das palavras... as palavras... as palavras

A aventura das palavras... das palavras... as palavras... as palavras
São o chão em chamas onde as lavras

quarta-feira, julho 23, 2014

NOEMA SINGULAR



Aberto e imenso o dia respira,
Pulsa no tempo fertilizado,
No azul, que é todo eco de lira
E silêncio infinito escutado…

É nele que te vejo s’os olhos fecho
Numa dança sufi e de contato,
Astro nauta a distar ínfimo seixo
No universo de cada som e ato.


J Maria Castanho

terça-feira, julho 22, 2014

VÍCIO DE SER BOM



Por que me assusta tanto viver
Se é de tudo quanto quero mais?
Porque há comigo a forma de ser
Sendo, como se fazem os cristais.

Mártir é assim que cresce, pois é
Cristalizando nos modos do parece
Água saturada de açúcar ou fé
Mal o ponto atinge, logo endurece.

E ao bem, tanto o quis, o consegui
Em mim, por demais o fiz acontecer;
Agora é muito, que de tanto bem o vi
Em mal se tornar, e mal não deixa viver.


J Maria Castanho 
ESCARAMUÇA POÉTICA



Hoje estou disposto a naufragar
Na intrepidez do destino arriscando
Verbo sobre verbo, em afoito conjugar
Da própria voz desobediente ao mando
Num desmando só por si própria ouvida…

Tenho a sofreguidão da rima
E a bárbara educação da barbárie,
Mas ante a sílaba frouxa, dessentida
Aperro-a no freio, salto-lhe pra cima
Obrigando-a a atravessar a intempérie
Como se esse fosse o único rio da vida.

Ela mal me ouve, que eu bem o sei;
Porém, ao sentir-me a domá-la, e vencida,
Nomeio-me a mim mesmo seu patrono – e rei!


J Maria Castanho

domingo, julho 20, 2014

DELITÉDIO PERFEITO
























Quando o tédio morrer de tédio
Então, é que vão ser elas!...
Podemos até queixar-nos de assédio
Ou de ter comprado gato por lebre,
Sofrer de alzheimer, obstipação, febre,
Solidão, desamor e demais esparrelas
Que a vida tem nas bermas e courelas.

Podemos fazer trinta por uma linha,
Acender quezílias, autos e querelas,
Como defender qualquer erva daninha
Da arbitrariedade e outras mazelas
Que à tinha ataquem com pior tinha.

Sim, que se o tédio morrer de tédio
Dificilmente teremos melhor remédio
Senão mexer na língua às apalpadelas,
Que quando o tédio anela o dedo médio
Bem podem as estrelas ser doces e belas,
Orientar leituras e guiar cinderellas,
Inspirar ninfas de rio como de prédio,
Sentar-se a gente em bicos de sovelas,
Pois tédio morto, nem cheiro tem
Nem servirá nunca pra entediar ninguém.


J Maria Castanho

sábado, julho 19, 2014


ACTA DO AGORA EXTEMPORÂNEO

 


Com subscrição unânime e absoluta,

Os homens e mulheres de amanhã,

Decretam ser o hoje a ponte diminuta

Entre tempos que nada têm entre si,

Sob as telhas celestiais da utopia vã,

Ou as íngremes rampas do salto em esqui:

O incerto futuro e o ressentido passado.

 

 

Por mim, dou-lhes anuência e total razão

Pela singela aspereza crua do decretado,

E mais adianto dever-se editá-lo com ilusão,

E duas demãos firmes e espessas sobr’o croqui,

Que é matéria que não sofre com erosão

Nem carece de qualquer outro cuidado,

Além do tal senão

Que toda a bela traz consigo acoplado.

 

Nada mais havendo a tratar no agora

Num ato que às atas muito diz e seduz,

Vou-me embora, sem a mínima demora,

Ainda assim se não apague a luz.

 

J Maria Castanho

sexta-feira, julho 11, 2014

O GUARDADOR DE VINHAS



É suposto haver medo
Na penumbra do receio…
Quem sabe, se tal enredo,
Não nos seduz, e nesse enleio,
Enamorados, guardamos segredo
Do quanto estamos amedrontados?

O que nos é dito, nem ouvimos;
E o que sentimos, logo apagamos,
Aind’assim alguém não o note,
Enleado no lodo e nos limos,
Controversos moinhos e panos,
De todos os Sanchos sem Quixote!


J Maria Castanho

quarta-feira, julho 09, 2014

NO EITO DA SAFRA



Desse, que chão inacabado
Onde nos habita a vastidão,
Há outro mesmo de nenhum lado
Abrindo pétalas de gratidão,
Em ledas cidades e capitais
A florescer nas estepes e sertão,
Como nas várzeas e canaviais.

Que sendo uno é mais que mil,
Acesa chama da pluralidade,
Cujo verde é sempre um Brasil
No amarelo vivo da amizade.


Joaquim Maria Castanho

terça-feira, julho 08, 2014

PAIXÃO EXISTENCIAL




Há quem diga que a vida é
Um desengano constante;
Pois, pra mim, ela foi até
Além de esposa… amante!


Joaquim Maria Castanho
TALVEZ!



Tanto me dói este ser
Como ser sem condição,
Que o talvez é um parecer
Onde perece o «sim» e o «não».


Joaquim Maria Castanho

segunda-feira, julho 07, 2014

NEM TUDO O TEMPO CURA…



Só o tempo perdoa
Aquilo que o humano não esquece;
Que o perdão entoa
A justiça, que com ele se fortalece.

Porém, o justo não oblitera
As passagens ao passado,
Antes omite quem se não esmera
E com os demais é descuidado.


J Maria Castanho 

domingo, julho 06, 2014

FULGOR IMPETUOSO



Por cada momento que passa
Outro há que nasce imediatamente,
Secundando-o, e logo disfarça
Os limites entre causa e consequente,
E que nenhum respeito à ordem diz
Perante o motivo que tal assim quis…

Mas a mim, o momento parou, absoluto
Nessoutro cuja presença indesmentível
Eras só tu, meiga e rigorosa, exigente e dócil,
Repetido eco feliz da felicidade fulgente,
Quais ondas de memória que agora escuto
Melhor se por elas foste ardente tumulto.

quarta-feira, julho 02, 2014

DEDO NO AR



Nenhuma saudade é pequena…
Que ela ou se sente, ou não se sente.
Tal e qual como aquele ser que acena
Se nos perguntamos quem, afinal, somos
Respondendo de imediato: «Gente!»


J Maria Castanho