APELO
DE PELE
Reconheço que no dia-a-dia há nuvens
de poeira
E nem tudo será só pura e singela transparência
Pois toda a gente tem segredos seus
inconfessáveis
Difíceis de dizer, de calar, de
escrever, de expelir
De deixar esquecidos numa qualquer
rua, esquina
De grafitar nas paredes daquelas casas
em ruínas
De abandonar no banco de jardim ou
gare ferroviária
De acondicionar entre os livros da
biblioteca pública
De encaixotar no sótão com demais
trastes e bibelôs
De meter na gaveta das trivialidades
preciosas
Junto aos cromos, aos porta-chaves, e
fotografias
Calendários velhos, bilhetes de teatro
ou concertos
Recortes de fait-divers, catálogos de
exposição, clipes
Botões invulgares, relógios avariados
e colchetes ímpares,
Embora se tenha esforçado capciosa e
exaustivamente
Fintando-se amiúde ou tentando
desmascarar-se
Pra nada permitir oculto de si e de
seus semelhantes...
É risco plausível, sem dúvida, porém
deixar de o correr
Somente porque nos estreita essa
indiferença humana
Tão caraterística de nós enquanto nos
medimos forças
Acerca de tudo e de nada, quais molas
de propulsão
Disparadas no inverso do modo,
aflige-nos eficazmente:
E até há quem grite «olha pra mim,
belisca aqui – vês... sou gente!»
Joaquim Castanho
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